Quase um efeito etílico. Meu estado era daquele rodopio do protagonista de “Cidade de Deus” (2002) em meio ao fog névoa de “Ensaio sobre a Cegueira” (2008) após uma viagem por três continentes como um “Jardineiro Fiel” (2005). Saí de “360” trocando de escada rolante, em vez de pegar a que desce.
Em breve instante, lembrei que foi por umas experiências com corpos em queda (em planos inclinados) que Galileu acabou perseguido pela Inquisição. Mas Newton me salvou antes de me espatifar no chão.
Vejam como se pode combinar Cinema e Física… “360” é um mosaico ensandecido, picotado, angustiante e transnacional. Sim. Tudo parece inconcluso numa Babel (!) ao quadrado, por isso há quem diga que, por pecado de roteiro, esse não é o melhor filme de Meirelles… Personagens e episódios se interrompem, entrelaçam-se quase ou apenas se esbarram, conectam-se no detalhe – a boina vermelha, a pilastra no aeroporto. Mas, creia, passado o efeito da saída, percebo que nada falta nessa montagem mágica e cirúrgica (Daniel Rezende), em que Fernando Meirelles ignorou cânones.
Inspirado em “La Ronde” (peça escrita por Arthur Schnitzler em 1897), “360” é o mundo de hoje, o universo que a todos engloba e reduz, entre as perdas, taras e danos. Uma jovem tcheca (Lucia Siposová) nos conduz a um executivo (Jude Law) que chama por telefone a esposa Rose (Rachel Weisz) que, por sua vez, tem um affair com um fotógrafo (Juliano Cazarré) casado com Laura (Maria Flor). Laura encontra um “Old Man” (Anthony Hopkins) num voo, além de um ex-“tarado” (Ben Foster) no aeroporto. Aí este cruza com um argelino, chefe de Valentina (Dinara Drukarova) que logo encontra com quem? O “Old Man” e a roda gira… em Viena, Paris, Londres, Rio de Janeiro, Bratislava, Denver, Phoenix. Seja Hopkins com Flor (Que orgulho!), ou Cazarré com Weisz (Idem!), os personagens são partículas vistas do espaço que se atraem. Lei do gênio Newton.
Quiçá simples elos no horizonte como se a terra plana fosse, cada personagem em sua pequenez – a nossa – é uma identidade plena. Como diz Anna (Gabriela Marcinkova), para ser salvo na ronda, basta escolher um caminho na bifurcação. E basta, porque toda história é essa.
Claudia Furiati